Frater Optimus e a Numerologia

Frater Optimus

Nosso colunista, Frater Optimus, é um mago das antigas; e, como todo bom senhor de idade, se tornou um tanto intransigente com o passar dos anos. E é na sua coluna que ele descarrega sua intransigência. O que ele diz nem sempre está certo, mas vale a pena ouvir a voz da experiência – nem que seja para poder discordar com propriedade!

Nessa semana, Frater Optimus fala sobre a tal da Numerologia – confira o que ele acha dessa ciência (?) milenar.


Era só o que me faltava. Outro dia me apareceu um sujeito que eu mal conheço dizendo que fez uma análise numerológica do meu nome e que tinha descoberto várias coisas sobre mim. Será que essa gente pensa que eu nasci ontem? Vocês podem pensar e dizer o que for sobre mim. Mas não achem que eu nasci ontem. Análise numerológica? De nome? Onde ficou o senso de ridículo dessa gente?

Numerologia não é novidade. Desde a antiguidade as pessoas tentam atribuir sentido às coisas. A gematria é um campo de conhecimento antiquíssimo, por exemplo. Mas com essa onda mais atual de new age, parece que a numerologia ganhou toda uma nova relevância, principalmente entre pessoas que não fazem ideia do que estão falando. Pudera: as pessoas querem enxergar o sentido das coisas. Ligar números e letras parece natural. Mas não é! Nem tudo nesse mundo precisa fazer sentido. Pouquíssimas coisas fazem sentido, aliás. Mas acho que não passaram esse memorando para essa gente besta. Que coisa mais patética.

Se numerologia fizesse algum sentido, os mesmos números teriam os mesmos significados em todas as culturas antigas com um mínimo de discernimento. Existe, por exemplo, uma equivalência – a grosso modo – entre panteões diferentes de diversas culturas. Mas não existe uma equivalência entre os significados de números em culturas diferentes. Na verdade, os próprios números são uma criação abstrata: hoje nós usamos a base 10 para a maioria das coisas, mas essa não é a única base numérica que existe.

E um mesmo número – por exemplo, 3 – não significa a mesma coisa para os chineses, para os hebreus, para os gregos e para os hindus. Então, das duas uma: ou todo mundo está errado, ou só uma cultura está certa. Eu prefiro ficar com a primeira explicação.

Eu não sou muito fã do Livro da Lei, mas ele diz algumas verdades. E aqui vai uma delas:

Todo número é infinito; não há diferença.

AL, I:4

O próprio texto se contradiz, porque fica inventando significados ocultos para vários números (11, 418, etc.), o que não faz nenhum sentido já que “não há diferença”, mas pouco me importa o que o resto do Livro diz.

Eu até entendo (um pouco) quem tenta achar significados numéricos em textos. Explico o porquê: se a correspondência entre números e letras é conhecida, é possível que alguém, ao escrever um texto, faça isso de forma a esconder um significado numérico especial, que uma pessoa que conheça as mesmas correlações seja capaz de desvendar. E é por isso que eu não desprezo completamente a gematria, por exemplo. Mas tem uma coisa que eu não entendo: quem tenta descobrir “verdades” sobre si ou sobre os outros usando a numerologia do nome. Como fizeram comigo. É o fim da picada.

Eu entendo que o nome, até certo ponto, define a personalidade de uma pessoa. Um cidadão chamado Apariaguarialdo, por exemplo, provavelmente terá uma vida mais sofrida do que se chamasse, simplesmente, João. Também entendo que um César tenha mais autoconfiança do que um Rosercleibson. Isso vem da simples associação entre o primeiro nome e os Césares de Roma, ao passo que o segundo nome só significa que os pais dessa criança não têm noção alguma. Mas qual é a diferença prática entre Vítor e Victor? Na minha opinião, nenhuma. Mas se cada letra é associada a um número, esse “C” adicional deveria fazer toda a diferença. E, na prática, não faz.

Para mim está muito claro que essa coisa de numerologia é uma bobagem sem tamanho. Mais até do que astrologia (que é assunto para outro dia). Principalmente a numerologia do nome – essa é a pior de todas. Eu vou dizer para que eu acho que serve numerologia: para fazer a pessoa pensar. Não acho que haja, de fato, associações ocultas e intrínsecas entre números e significados específicos. Mas acreditar que sim pode fazer uma pessoa pensar, refletir. E pensamento e reflexão nunca são demais.

Se você não levou a sério nada do que eu disse, é bem capaz que esteja se perguntando como deve ser a numerologia do meu nome verdadeiro. Mas esse eu não revelo. Hoje em dia tem muito maluco por aí, e qualquer um pode pegar a lista telefônica e descobrir aonde eu moro. Eu, hein. Sai pra lá.

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